2 de março de 2011

Meu.

De repente me toma essa súbita vontade de escrever, escrever tudo! Sobre tudo, ou sobre nada, quem sabe? Mas me falta inspiração, me falta algum sopro, alguma luz divina; luz? Risquei luz, não quero luz, quero as palavras. Tão infinitas e belas como a Aurora. Como Bentinho dizia, quero as tranças de Capitu capazes de envolver o infinito um número inominável de vezes! Paro, fito e removo essa idéia. Busquei a inspiração errada, Assis. Triste dizer, mas digo, tu és grande demais para mim... Tragas-me como os olhos da pequena que inventastes e fico assim a amá-lo com todo meu coração adolescente.
Por Deus! Chega! Isso que dá buscar inspiração em estrelas distantes demais às mãos, me dá vontade de buscá-las com a alma, mas esta pequeninha teima em não voltar para o meu corpo triste. Triste corpo sem amor. E descubro então algo infinitamente mais triste: toda minha prosa lírica se vai como o vento se não tenho este tema. Porque a minha prosa não é libertação, Clarice, a minha prosa se prende ao meu coração apaixonado e não sou capaz de escrever mais nada. As palavras se vão. Simplesmente se vão... E sinto que saberia muito bem falar do pútrido, porque posso muito bem senti-lo. Posso falar do feio, do escuro, do fétido e literalmente mijado (o que poderia ser amor também), mas não vem. Não sei ao certo se há de vir ou se sou eu quem deve criar, a simples ordem dos fatos que mal enxergo me parece mais inexistente ainda. E já não tenho linha de raciocínio. Pra que raciocinar? Nunca precisei disso. Mentira, deveria fazê-lo, sempre, mas fujo porque pensar dói e cansa. Correr desesperadamente para o ato impensado é deveras mais gostoso do que calcular a intensidade deste pulo. Vê como isso é semelhante ao meu amor? Mas que amor? Não tenho nem a ânsia de estar em qualquer par de braços! Não tenho nada! Absolutamente nada! E esse vazio dói, esse buraco infinito, bucólico, niilista, puta que pariu, dói demais. 

18 de janeiro de 2011

Amigo é Pra Essas Coisas



-Salve..
-Como é que vai?
-Amigo há quanto tempo..                        
-1 ano ou mais..
-Posso sentar um pouco?
-Faça o favor.
-A vida é um dilema..
-Nem sempre vale à pena..
-Oh..
-O que que há?
-Rosa acabou comigo.
-Meu Deus! Porque?
-Nem Deus sabe o motivo..
-Deus é bom.
-Mas não foi bom pra mim..
-Todo amor um dia chega ao fim.
-Triste...
-É sempre assim.
-Eu desejava um trago...
-Garçon, mais dois!
-Não sei quando eu lhe pago...
-Se vê depois.
-Estou desempregado...
-Você está mais velho.
-É..
-Vida ruim..
-Você está bem disposto..
-Também sofri.
-Mas não se vê no rosto..
-Pode ser.
-Você foi mais feliz...
-Dei mais sorte com a Beatriz!
-Pois é..
-Vivo bem..
-Pra frente é que se anda..
-Você se lembra dela?
-Não..
-Lhe apresentei!
-Minha memória é fogo..
-E o l'argent?
-Defendo algum no jogo...
-E amanhã?
-Que bom se eu morresse!
-Pra que, rapaz?
-Talvez Rosa sofresse..
-Vá atrás.
-Na morte a gente esquece..
-Mas no amor a gente fica em paz!
-Adeus...
-Toma mais um!
-Já amolei bastante...
-De jeito algum.
-Muito obrigado,amigo..
-Não tem de quê.
-Por você ter me ouvido.
-Amigo é pra essas coisas.
-Tá..
-Toma um cabral.
-Sua amizade basta..
-Pode faltar.
-O apreço não tem preço, eu vivo ao Deus dará.

13 de janeiro de 2011

Hoje resolvi me apaixonar, de novo. Não sei muito bem o porquê.
Pode ser o tédio de uma tarde quente, o cd novo que nunca vem, a máquina de café quebrada, o fim do maço de cigarros, as muitas latas de cerveja, vazias, aos meus pés. Pode ser essa chuva infinita, pode ser minha caixa de remédios. Pode ser a sua simples presença, que some com tudo isso.
Sabe, no fundo eu sou um sentimental. Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo (além da sífilis, é claro). Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar...Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora...Meu coração tem um sereno jeito. E as minhas mãos o golpe duro e presto, de tal maneira que, depois de feito, desencontrado, eu mesmo me contesto. Se trago as mãos distantes do meu peito. É que há distância entre intenção e gesto. E se o meu coração nas mãos estreito, me assombra a súbita impressão de incesto. Quando me encontro no calor da luta, ostento a aguda empunhadora à proa, mas meu peito se desabotoa. E se a sentença se anuncia bruta, mais que depressa a mão cega executa, pois que senão o coração perdoa.

6 de dezembro de 2010

Intolerância, violência, adversidade, raiva, ódio, preconceito, ignorância, omissão, alienação...Já é a quinta ou sexta vez que penso em um bom modo de iniciar um texto simples, onde eu defenda meus valores e mostre a minha indignação, sem me vitimizar, em relação ao noticiário e suas reportagens sobre agressão homofóbica. Bom, não posso pensar em nada além dessas primeiras nove palavras..mas no momento seguinte, quando me lembro de não esquecer o essencial, me vêm amor, esperança, amizade, humanidade, carisma, alegria, compaixão, fé, sensibilidade, afeto, carinho, companheirismo, positividade, paz. E então eu descubro o pior, ou o melhor! Descubro a minha fé, minha quase loucura em acreditar na humanidade! Em acreditar no peito que abraça, na boca que sorri, na pele que sente, na alma que se encanta. Ah, acredito. Há o problema, mas não vou enfrentá-lo com mais agressão e desafeto. Não. Que me batam, que me odeiem, que me descriminem. Cá estou. Imutável. Inabalável. Perante a minha própria natureza.